César, Diego e nós
O desejo da gente não é definido, fixo. Ele não precisa ser "descoberto", mas inventado |
AS LÁGRIMAS de felicidade de César Cielo me comoveram. Também me comoveu a consternação de Diego Hypólito depois da queda que o privou da medalha olímpica.
Anos de dedicação e controle de si acabaram, para César, num momento em que ele nadou como nunca e, para Diego, num erro inesperado. César tinha dificuldade em acreditar que seu sonho estava acontecendo. Diego repetia: "Não acredito que perdi".
Com um amigo, domingo à noite, conversamos sobre o que faz o estofo dos campeões.
Evocamos aquela idéia da sabedoria popular que faz sucesso na literatura de auto-ajuda (por exemplo, "O Segredo", livro e filme) e que diz o seguinte: descobrir o que a gente deseja e desejá-lo ardentemente é bom e eficiente, pois quem deseja muito, mais cedo ou mais tarde, realiza suas aspirações.
Na mesma veia, organizar nossa existência ao redor da ocupação da qual a gente mais gosta parece ser o jeito de matar a charada da vida.
"Logicamente", com a paixão pelo ofício de cada dia ("adeus depressão"), serão multiplicadas as chances de sucesso (merecido, pois, no caso, só poderemos nos entregar a nossas tarefas com o maior afinco e com prazer).
É fácil entender de onde vem essa idéia. Você passa o dia aflito, correndo atrás das complicações de seu trabalho e de seus deveres e, quando, à noite, coloca em ordem sua coleção de selos, pensa em desistir de tudo e abrir uma lojinha filatélica.
Movido por sua paixão, quem sabe você escreva, enfim, o novo catálogo definitivo dos selos da Colônia, do Império e da República do Brasil; logo, a lojinha crescerá até se tornar o grande centro on-line de troca, comércio e avaliação de selos nacionais.
Mas há um problema: essa idéia é ingênua. Não tanto por ela subestimar as dificuldades eventuais de sua lojinha filatélica, mas por duas razões fundamentais:
1) O desejo da gente não é um desejo definido, que seria "o nosso" (como uma espécie de DNA psíquico) e que se trataria de descobrir e logo seguir à risca. O episódio bíblico do pecado original é uma boa metáfora da condição humana. Todas as necessidades estavam satisfeitas no Paraíso terrestre, e fomos querer um fruto que não sabíamos direito o que era: a humanidade (pecadora, claro) surge quando começamos a desejar além do que satisfaz nossa necessidade de sobrevivência. Como nosso desejo não é regrado pela necessidade, ele é variável, não depende do valor intrínseco dos frutos desejados, nem da singularidade de nosso paladar, mas de nossos vínculos com os outros: no caso, com as Evas que nos seduzem ou com a vontade de transgredir a ordem divina. Conclusão: nosso desejo é o fruto volúvel das ocasiões, das circunstâncias e, sobretudo, das relações com nossos semelhantes; ele é uma disposição que INVENTAMOS -não que DESCOBRIMOS.
2) Inventar um desejo não é nenhuma garantia de talento. É possível desejar ser nadador, ginasta ou filatélico sem ter talento para nenhuma dessas atividades. Em tese, isso não teria que ser um drama, visto que poderíamos procurar (ou melhor, inventar) outro "fruto" desejável, mais compatível com nossas aptidões. Mas não funciona assim. Na parábola bíblica, o nosso gosto pelos frutos proibidos indica que, em geral, preferimos desejar o que está fora de nosso alcance, por ser objeto de interdito ou, justamente, por ser irrealizável à vista de nossas modestas habilidades. Ou seja, em vez de desejar de galho em galho segundo as ocasiões e conforme nossas aptidões, preferimos almejar o impossível. O aspirante filatélico sofre de uma sudorese que estragaria qualquer selo; o aspirante literato não gosta de ler, e por aí vai: gostamos de visualizar futuros que nunca chegarão.
Pois bem, os campeões, ao menos durante um tempo de sua vida, focam seu desejo, ou seja, persistem em desejar apenas uma coisa. Até aqui eles são parecidos com a gente.
Só que, diferentes da gente, eles se autorizam a desejar uma coisa que é difícil, mas que não lhes é impossível: desejam a excelência num ofício para o qual eles têm talento. Restaria se perguntar por que um campeão pode falhar. Pois bem, até os campeões precisam daquela coisa que faz com que, um dia, milagrosamente, a disposição, o humor, a temperatura, o brilho do sol ou o barulho da chuva conspirem para que tudo dê certo. Ou seja, precisam de sorte. Boa sorte a Diego nos próximos Jogos Olímpicos.
(fonte: http://www1.folha.uol.com.br/fsp/ilustrad/fq2108200826.htm)
eu li esse texto logo que foi publicado na folha. li e reli, cheguei a comentar com algumas pessoas. fiquei com uma sensação de que era um desses momentos em que o mundo, deus ou seja lá quem manda uma mensagem. aquela coisa meio "vamos ler a sorte nos acontecimentos".
aí minha mãe me deu ele pra ler anteontem, provavelmente por conta da mensagem do "com esforço e com o seu talento, você vai conseguir" (não, não pretendo ser campeã olímpica, estou estudando para concurso), e isso só reforçou a idéia do "isso é uma mensagem que eu preciso ler e interpretar".
essa questão de desejar o impossível, aquilo para o que não fomos talhados, é que chamou minha atenção de cara. porque eu andava numa imensa crise vocacional, tendo momentos de verdadeiro desespero ao me imaginar trabalhando com certas coisas o resto da vida, mas sem enxergar uma opção. porque, vamos combinar, olhar as profissões pelo lado interessante de cada uma (algumas não têm esse lado interessante, claro), é fácil. mas pense o que seria, concretamente, trabalhar com certas coisas? continua sedutor?
então, eu estava tentando me conformar que trabalho nunca seria a coisa que eu mais iria amar na vida. e isso não é exatamante um motivo para pânico, afinal essa história do "eu amo tudo o que faço" não me soa verdadeira em 99% dos casos. mas também não poderia ser uma coisa que me desse vontade de sumir todo dia de manhã.
não posso dizer que a crise passou, mas acho que ela tem a ver com outras coisas, leia-se, com estado de espírito, leia-se, depressão. de qualquer forma, eu também conversei loucamente com um monte de gente e matutei e matutei, e acabei concluindo que essa coisa de crise vocacional dá muito em que tem opções. o cara que era pobre de marré de ci e conseguiu um emprego de boy na empresa do patrão da casa onde a mãe dele trabalha, e depois foi e conseguiu fazer um vestibular, e no fim chegou lá, como se diz, não ficou nessa de "hum, mas na verdade eu queria era estudar música barroca". sim, eu sei que estou generalizando, mas é mais ou menos por aí que se pensa quando se diz que depressão é doença de rico. essa coisa de "ai, me sinto incompleto", muitas vezes, tem a ver com ter tempo para se sentir incompleto, e ficar naquela frustração de não ter conseguido desenvolver todas as suas potencialidades, ou seja, continuar a estudar línguas, ter aulas de tênis e tal. porque quem não teve as oportunidades, quando conseguiu umazinha só, provavelmente ficou muito feliz.
sei que estou sendo generalista e determinista, mas eu realmente penso que essa é uma possível explicação para esse lance de "não sei o que eu quero da vida". disseram à gente que o importante é ser feliz e todo mundo acreditou que é totalmente possível ganhar dinheiro fazendo o que se mais gosta, ainda que isso seja jogar videogame ou ouvir música. e, tipos, é mentira. é possível porque impossível não é (sim, eu sei que essa frase ficou podre), mas será que é razoável pensar assim? até porque querer é ótimo, mas ter coragem de ir atrás e ficar firme no seu propósito é coisa de poucos.
e finalizando esta imensa divagação, a outra coisa que me chamou a atenção foi a questão do esforço e da perseverança. e isso acabou sendo uma mensagem de estímulo, que é bem o que eu preciso neste momento. e, bom, desde segunda que eu estou tentando fazer a minha parte. mas não vou falar disso aqui, porque vai ficar o post mais chato EVER! só sei o seguinte: quero minha torcida!
2 comentários:
Me dê um J
Me dê um U...
A primeira cheerleader você já angariou!
Boa sorte!
Mas comadre, se trabalho fosse bom chamaría-se diversão...
MUito boa sorte!!!
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