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sábado, 28 de março de 2009

síndrome de estivadora

eu fiquei muito impressionada com algo que li no blog da pher: Como diriam as feministas, a mulher ideal está ligada a uma idéia de diminuição: juventude, traços delicados, corpo magro, voz fina, escassez de pêlos, modos discretos, poucos parceiros, etc. Ou seja, existe essa parte de critérios estéticos. A mulher mais de acordo com os padrões tem mais pretendentes e seria bobagem negar isso.

sim, eu sei que somos educadas a ocupar o mínimo possível de espaço (enquanto os homens fazem questão de conquistar todo o espaço possível, sentando de pernas abertas no metrô, por exemplo), a comer pouco (por uma questão de educação mesmo, para não ficar numa vibe ogro), a falar baixo, a sorrir (sim, as pessoas adoram dizer às mulheres que sorriam, e nenhum desconhecido normal jamais dirá isso a um homem), etc, etc. não é minha pretensão nem meu objetivo fazer um manifesto a respeito da repressão secular feminina e tal. eu só vim falar de mim e de me achar um neardenthal junto deste padrão.

tudo bem que eu não falo alto, nem como de boca aberta, nem como as mãos. mas sempre que tenho a sensação de ocupar mais espaço que o "normal" das mulheres, me sinto assim, grande. e não tem a ver (só) com peso. eu tenho cabelão, bem cheio, comprido, cacheado, uma juba. tenho bocão e sorrisão. falo gesticulando horrores (é quase um milagre que eu não viva batendo nos garços incautos). jamais serei descrita como uma pessoa que anda quase flutuando (e nada como andar com um sapato mais pesado num piso de taco para se sentir um iéti). não sou fisicamente leve (então, nunca serei convidada a dançar coisas que façam com que o parceiro suporte meu peso). não danço suavemente - na verdade, eu já disse diversas vezes que eu não danço, eu faço performance, e alguém vai descrever uma drag queen como delicada? sou engraçada, conto histórias para que as pessoas riam, e isso inclui imitar vozes, trejeitos e afins (ou seja, discreta aonde?). ainda por cima, gosto de acessórios grandes (anéis, brincos, colares, bolsas) e de cores vivas (e odeio tons pastéis).

visualize: dona jura meets viúva porcina meets tancinha da novela sassaricando.

não bastasse isso, ainda me sinto um pouco como aquele personagem de claudia raia na novela rainha da sucata, a "bailarina da coxa grossa". não pela circunferência das minhas pernocas (na verdade, eu tenho canela de sabiá), mas pela característica de ser fisicamente desastrada. vivo me batendo, me prendendo em cabides e maçanetas de portas, e derrubando coisas com o quadril (quem foi o *&%$* que gritou "charlene!"?). também sou bem o tipo de pessoa que é capaz de estar com uma caneta na mão e ao gesticular, arremessar longe (super phyna), ou que quando vai atender o telefone, derruba antes. mas não sou elefante em loja de louças, porque, talvez por me conhecer, eu ajo de forma bastante cuidadosa nas imediações de coisas delicadas e quebráveis.

aí, nada mais justo que minha mãe e minha irmã digam que eu tenho toda uma vibe estivador quando vou abrir a porta, fechar a janela do quarto para ligar o ar condicionado, digitar, mexer o suco (o advérbio usado é "vigorosamente")...

após pintar um retrato da situação, espero que as pessoas entendam o quanto é difícil estar junto de mulheres femininas, magras e mignons sem me sentir um dinossauro, inclusive na altura. e não adianta me dizer pra andar só com gente mais alta, medindo 1,62m nem é difícil achar gente mais alta que eu. mas estar perto de mulheres delicadas e altas me faz sentir o aríete do he-man (ou insira aqui o atarracado de sua preferência)!

não pensem que eu estou lamentando; se eu quisesse tanto ser inha, teria me policiado e tentado me tornar isto. ao contrário, por ter sido (e ainda ser) tímida, eu acho que inconscientemente luto contra com a arma que tenho: a expressividade. e, pensando bem, audrey hepburn é linda, elegante, classuda, mas você se imagina passando uma noite super divertida com ela, bebendo, falando besteira, dançando, surtando, lembrando de micos que pagou, cantando no bar? eu não.

p.s. dedico este texto a todas as minhas amigas que são, de alguma maneira, superlativas, e me entendem.

3 comentários:

Caminhante disse...

O engraçado dessa história de "critérios que diminuem" é que, assim que ouvi (talvez por ter sido de quem ouvi) me pareceu cisma de feminista radical. Depois parei pra pensar e vi que pra todo canto que eu olhava, realmente faz sentido!

Você não é uma mulher comum e pra você não serve um homem comum. Querer te transformar numa mocinha phyna é querer matar justamente a parte mais interessante em nome de uma padronização boba. Em algum lugar - que ainda não achamos, seria uma ilha? - existem homens que conseguem dividir seu espaço com uma mulher sem se sentirem ameaçados pela exuberância dela. E é um homem desses que merece você.

(O que eu falei tbm serve pra todas as outras amigas superlativas)

Ana disse...

Impossivel nao pensar "puts, esse post foi feito pra mim". Egocentrismo a parte (sera?) as vezes acho que nunca nos enquadraremos naquilo que esperam de nos.

Meus pais, coitados, ja tentaram de todo jeito. Primeiro, ballet na principal academia de danca cascavelense. Posteriormente, curso de modelo & manequim na famigerada Adonis Scussiatto. La, o professor de andamento e postura, nao permitiu que eu fizesse a famosa banca do sindicato pois jamais passaria.

Depois disso, fiz taekwondo e jiu-jitsu. Sentia-me igualmente fora do padrao. Enfim, acho que a saida eh tatuar uma ancora no meu braco e sair mundo afora, comportando-me como sempre sonhei... Burp! MalZ ae, to tomando cha verde.

Ana disse...

E sim, acabo de lembrar que ja comentei sobre esse lance do curso de Modelo & Manequim aqui. Mas o TRAUMA eh tao grande que nao canso de repetir essa historia, para as pessoas verem como o ser humano pode ser filho da puta.